Por David da Silva
A Revolta da Cachaça rolou na cidade do Rio de Janeiro do final de 1660 até abril de 1661. Mas a encrenca já estava fermentando desde 1647.
Invocado com a alta grana que o aguardente rendia aos donos de engenhos de cana do Brasil, o rei de Portugal proibiu a produção da manguaça no solo brasileiro. Só ficou permitido o consumo da pinga para os escravos negros e para o povo de Pernambuco, na época dominado pelos holandeses.
Invocado com a alta grana que o aguardente rendia aos donos de engenhos de cana do Brasil, o rei de Portugal proibiu a produção da manguaça no solo brasileiro. Só ficou permitido o consumo da pinga para os escravos negros e para o povo de Pernambuco, na época dominado pelos holandeses.
A bronca do monarca lusitano era porque a birita de cana estava detonando o comércio do vinho portugues. Quando os holandeses foram postos pra correr de Pernambuco, a coisa azedou mais ainda. Muitos produtores deixaram de fazer açúcar para produzir cachaça.
A pinga era forte moeda de troca na compra de escravos africanos.
Puto com o verdadeiro mar de pinga que escorria do Brasil para a África, em 1659 o rei de Portugal mandou destruir todos os alambiques da colônia. Os navios do tráfico manguaceiro também foram arregaçados.
Mas a Coroa Portuguesa não embaçava com os produtores de cachaça da cidade do Rio de Janeiro... E a água-que-passarinho-não-bebe rolava solta na Cidade Maravilhosa. Até que um dia...
Pingaiada carioca
No ano de 1660 o Rio era governado por Salvador Correia de Sá e Benevides. Este sujeito estava precisando de uns trocados para equipar o seu exército. A solução dele foi a mesma de qualquer político (o Lula fez isto recentemente): mandou elevar o imposto sobre a pinga. Sorte que na época os vereadores ainda serviam para alguma coisa. A Câmara Municipal carioca concordou com a elevação do tributo, mas liberou o comércio do goró.
Certo dia o governador do Rio teve de viajar a São Paulo. Deixou no comando seu tio Tomé de Sousa Alvarenga.
Neste meio tempo, 112 produtores da pinga carioca tramavam uma rebelião, e se reuniam na fazenda de Jerônimo Barbalho. Os fazendeiros ficaram seis meses curtindo a bronca.
Aproveitando que o governador tinha ido dar umas voltas, na madrugada de 8 de novembro de 1660 os senhores de engenho atravessaram a Baía da Guanabara, acordaram o povo com o toque de sinos e fizeram um auê na frente da Câmara. Exigiram o fim do imposto sobre a cachaça. E ainda queriam o dinheiro arrecadado de volta!!!
Tomé de Souza Alvarenga era cagão, e cedeu aos revoltosos. Os fazendeiros tinham subornado os soldados – que estavam com os salários atrasados – com a promessa de atualizar os pagamentos.
As casas do governador foram saqueadas, e seu tio, preso. Os fazendeiros aclamaram Agostinho Barbalho novo governador. Mas este refugou, e foi se amoitar no Mosteiro de São Francisco. A galera arrancou o vacilão à força e o obrigou assumir o cargo.
Ressacas de uma rebelião
Só que Agostinho começou a fazer média com a família do governador deposto. O povaréu se arretou com as manobras conciliadoras do novo governador, e esperou a hora certa pra cobrar a bronca. Quando Agostinho convocou novas eleições para a Câmara, os participantes da Revolta da Cachaça o derrotaram no voto.
Só que Agostinho começou a fazer média com a família do governador deposto. O povaréu se arretou com as manobras conciliadoras do novo governador, e esperou a hora certa pra cobrar a bronca. Quando Agostinho convocou novas eleições para a Câmara, os participantes da Revolta da Cachaça o derrotaram no voto.
Vai daí que assumiu o governo Jeronimo Barbalho, aquele mesmo na casa de quem foi tramada a rebelião. E não é que Jeronimo se revelou um tremendo mau caráter? Passou a agir autoritariamente. E ainda cometeu a besteira de perseguir os jesuitas!!! Os padrécos viraram um satanás debaixo da batina, e ajudaram o ex-governador Salvador de Sá a montar um exército com índios e mestiços paulistas, para combater Jeronimo. O govêrno da Bahia, obediente à Companhia de Jesus, mandou-lhe dois navios de reforços.
Na madrugada de 6 de abril de 1661 os marinheiros baianos atacaram pela praia. Salvador de Sá avançou com os paulistas pelo interior. Os líderes da Revolta da Cachaça foram pegos de calças na mão.
Os rebeldes Diogo Lobo Pereira, Jorge Ferreira de Bulhão e Lucas da Silva foram mandados a Lisboa para julgamento. Jeronimo Barbalho levou a pior: foi enforcado, decapitado e teve sua cabeça espetada no pelourinho.
Tudo se resolve na "saideira"
Mas nem tudo estava perdido. O Conselho Ultramarino deu razão aos participantes da Revolta da Cachaça, libertou os três que haviam ido à Côrte para serem julgados, e destituiu Salvador de Sá do cargo.
Naquele mesmo ano de 1661 a regente Luísa de Gusmão liberou a produção da cachaça no Brasil. Mas só para exportar para Angola; tomar birita por aqui ainda era crime.
Em 1695, finalmente foi liberada a fabricação e consumo da marvada pinga no Brasil.
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